sábado, 14 de agosto de 2010

Uma jornada no ginecologista

Uma ida a qualquer médico (dermatologista, otorrino, cardiologista, etc) pode deixar algumas pessoas um tanto apreensivas. O que dizer então de uma consulta ginecológica? Ainda mais tenso não?
 Certamente sim para as “marinheiras de primeira viagem”. Mas também pode ser uma situação de ansiedade e nervosismo para “as mais experientes”, que já se consultaram algumas vezes.


Isso é muito compreensível, sim sim.
Reflitam: é uma ocasião em que a mulher irá expor as regiões mais íntimas de seu corpo, as regiões que aprendeu a preservar e esconder do âmbito “público” durante a vida toda.
Uma consulta ginecológica é um momento profissional situado na esfera do social, mas dela deverá fazer parte o exame visual e tátil dos genitais, órgãos reservados às relações do âmbito íntimo da vida.

Para ajudar a amenizar a tensão desse evento na vida feminina, vamos fazer duas coisas:

• A primeira: fazer um pequeno discurso sobre a naturalidade do ato
Não é blá blá blá, mas um papo muito sério. Para o médico examinador tudo é muito natural, muito cotidiano. Algo que ele faz todos os dias e para isso recebeu intenso treinamento na época da graduação e da residência. A ginecologia é um assunto que ele estudou muito antes de praticar de modo estritamente profissional e científico nos serviços de saúde. Para que essa naturalidade possa gentilmente “invadir” toda a consulta, entretanto, é necessário que você, paciente, também se sinta à vontade e estabeleça com seu médico uma relação de confiança. É claro que isso depende um pouco de cada um, é um esforço conjunto. Da sua parte, o passo inicial é encontrar um profissional “que seja a sua cara”, que a faça se sentir segura e que se empenhe muito em cuidar da sua saúde.

• A segunda: uma tentativa de descrever um pouco uma consulta ginecológica típica. Acreditamos que isso poderá contribuir para amenizar o susto das mais jovens, e o desconforto de todas as que ainda não se habituaram ao consultório.

Pois bem, vencida a sala de espera, vamos a ele.

A CONVERSA ANTES - Você será recebida pelo médico e, antes de tudo, ele vai querer saber o que fez com que você o procurasse. Pode ser realmente algum problema, alguma preocupação, ou pode ser apenas uma consulta de rotina (aqui, pontinho positivo para aquelas que já se habituaram às consultas preventivas anuais mesmo sem ter queixas).
O médico vai querer saber tooooooda a história do seu problema, como começou, como evoluiu, como está atualmente etc.
O segundo passo será conhecer um pouco sua história menstrual, sexual e possíveis gestações. Algumas informações são fundamentais para que ele consiga raciocinar depois e escolher a melhor maneira de te tratar. Sim, ok, nós sabemos... são coisas que em geral as mulheres não gostam de dividir com estranhos: início das menstruações, início e situação atual da vida sexual, quantidade de parceiros até o momento, sintomas como corrimento, machucados, todos os medicamentos em uso, etc. Para compartilhar essas informações só mesmo tendo uma boa relação médico-paciente, não é? Por isso você não pode se sentir sendo entrevistada por um E.T. ou pelo Abominável Monstro das Neves. Talvez a primeira consulta seja um tanto estranha, mas se houver aos poucos uma boa relação médico-paciente, você conseguirá nos informar muito mais sobre coisas importantíssimas para o seu seguimento.

São também fundamentais os dados sobre suas doenças passadas e atuais, mesmo que não sejam da especialidade da ginecologia. Assim como a história de doenças na sua família, como diabetes, pressão alta, câncer... Aqui lembre-se: uma consulta médica é sempre um momento sigiloso. Tudo o que você disser é absolutamente um segredo, então sinta-se totalmente livre para relatar suas condições e sua história clínica.

Passada então essa fase, chega o momento do exame físico. Ai ai, você dirá, mas é isso aí, vamos a ele.

A ROUPA - A paciente terá a oportunidade de se despir num ambiente reservado e vestir um avental de exame. Ele serve pra que o médico abra e descubra apenas a parte do corpo a ser examinada no momento, uma de cada vez. Isso evita que a pessoa se sinta mais exposta que o necessário, preservando o profissionalismo do momento.

O EXAME DAS MAMAS - O médico primeiro observa (dados visuais dão boas pistas de algumas doenças). Depois ele fará a palpação. Na tentativa de identificar nódulos, usamos as pontas dos dedos para examinar todas as regiões da mama e das axilas. Por fim, verificamos se sai algum tipo de líquido dos mamilos, o que é feito com uma leve pressão. Nada disso deve ser dolorido, sem preocupações.

O EXAME DOS GENITAIS - Nesse ponto a paciente se deita na maca na posição que todas as pacientes gostariam de evitar certo? Pensemos assim: se é a melhor posição para o médico detectar algum problema, que seja ela então...
A parte externa será observada e depois o médico usará um aparelho chamado espéculo para visualizar o interior da vagina e o colo do útero. Esse talvez seja o momento de maior ansiedade do exame. Por vergonha ou por mais medo de sentir dor. Quanto à vergonha já conversamos, acreditem ou não para nós é um exame muito natural. Quanto à dor, ela não deve ocorrer. Mas novamente estamos num ponto delicado e que depende das duas partes envolvidas. Da experiência e delicadeza do médico e do nível de relaxamento da paciente. Por mais cuidadoso que seja o exame, contrações dos músculos da região podem causar um pouco de dor. Novamente vemos o quanto é importante a relação de confiança com seu médico: isso irá garantir mais conforto nesse momento. Se mesmo assim você estiver nervosa, não fique na dúvida, diga que está com medo. Não há problema algum e seu médico irá conversar com você para tentar acalmá-la.

Para tranquilizá-las mais, saiba que há espéculos de diferentes tamanhos e que mulheres com o hímen íntegro não passam pelo exame interno. Um detalhe, avise antes do exame que você é virgem, pois nem sempre o médico “adivinha” isso. Caso seja absoluta e comprovadamente necessário o exame interno, há um espéculo muito fino que evita qualquer ruptura local.

ESPÉCULO

Todo esse procedimento mais “invasivo” do exame é fundamental para que se possa fazer prevenção de câncer de colo do útero e testes para algumas infecções!

Agora estamos quase no fim. Após a retirada do espéculo é feito o exame de toque. Com um ou dois dedos colocados no interior da vagina e com a outra mão pressionando de leve sua barriga, o médico sente posição e tamanho do útero e dos ovários.

OUTROS EXAMES - Prooooooooonnto, acabou a parte que todas prefeririam ter pulado. Os outros exames realizados são aqueles que a gente já conhece, escutar o coração e o pulmão, medir a pressão, examinar o abdome, etc.

A CONVERSA DEPOIS - Para finalizar você vai se trocar novamente e volta para conversar com o médico. Ele vai explicar se pedirá exames, se vai receitar algum remédio e quando será a próxima consulta do seu acompanhamento.

Ok, concordamos que à primeira vista há etapas que as mulheres podem achar constrangedoras e incômodas. Mas aqui vai a parte feminina do nosso grupo falando: depois da segunda ou terceira vez no papel de paciente você vai achar tudo muito natural e vai se sentir bem e aliviada com a certeza de estar cuidando de sua saúde.

Para os nossos leitores masculinos fica a dica: espelhem-se nas mulheres e tenham um bom urologista, pois consultas de rotina e preventivas servem para vocês também ok?

Um abraço, até a próxima.

FONTE: Seidel, H.M. e al.., Guia de Exame Físico. Rio de Janeiro: Mosby - Elsevier, 2007
Porto, C.C. Exame Clínico - bases para a prática médica. Rio de Janeiro: Guanabara-Koogan, 2008.

quinta-feira, 12 de agosto de 2010

E o que acontece na gravidez?

Como primeiro post do blog por que não contemplar um assunto que, como um abismo, divide homens e mulheres do ponto de vista orgânico? A gravidez!
Divide sob uma ótica, une indissociavelmente sob outra...
Portanto, acreditamos ser uma matéria de interesse tanto para futuras (e antigas!!) mães e também para os pais.


A pergunta é: grávida, e agora? O que vai acontecer com o corpo dela?

Vamos tentar pincelar alguns aspectos mais palpáveis dessas modificações, sem entrar em detalhes bioquímicos-histológicos-microscópicos-inimagináveis.

Primeiramente: o útero! Sim, ele vai, em pouco tempo, abrigar um novo ser de mais ou menos 3 quilos. Para isso, foi projetado o órgão mais expansível do corpo humano. Antes de ficar "grávido" ele era uma pequena pêra quase maciça de mais ou menos 70 gramas e um espaço interno de 10 mL. Não, acreditem, um bebê não cabe ali...
Ao fim da gestação será necessário então algo em torno de 1200 gramas e com um volume de 5 litros. Isso sim é suficiente para bebê, líquido amniótico e placenta juntos!
Esse incrível aumento se deve tanto ao maior tamanho das células musculares uterinas quanto ao seu  estiramento.

Além disso, o útero passa a ter paredes mais finas e menos consistentes, o que nos permite sentir o bebê apenas tocando a barriga da mãe, identificando onde está a cabeça, as costas, os pezinhos, etc.

Mudança de tamanho, de consistência e, é claro, de posição. O útero antes da gravidez está inclinado para a frente na maioria das mulheres (e não é um problema se ele não estiver assim, sem preocupações!).
No começo da gravidez, essa inclinação vai aumentando e o órgão vai comprimindo mais a bexiga. E voilá... muitas e muitas idas ao banheiro por dia, porque cabe menos urina armazenada de cada vez.
Depois de 12 semanas, o órgão passa a disputar espaço também com outras estruturas do abdome, e então começa a crescer em direção ao lado direito da barriga da mulher. O estômago e o intestino perdem a briga e acabam sendo deslocados mais para o alto.

Passando agora às mamas, na mulher grávida, elas precisam se preparar para a amamentação. Vão pouco a pouco se tornando maiores, com mais vasos aparentes, a parte central (aréola) se torna mais escura e o mamilo maior.

Todo esse crescimento acaba por deslocar o eixo central do corpo feminino. Para não perder o equilíbrio e cair, a mulher começa a caminhar com as pernas mais afastadas e as costas inclinadas para trás e apoiadas nas mãos. A expansão rápida dos músculos abdominais pode gerar estrias, prevenidas com uso de cremes dermatológicos especiais.

E as cores? Elas também mudam. Na verdade escurecem. Além do mamilo e arredores, uma linha escura vertical pode aparecer no centro da barriga da mulher. Chama-se tecnicamente linea nigra. O rosto pode ganhar manchas chamadas "cloasma". E a vulva também se tornará mais pigmentada.

A vagina também vai se modificar durante a gravidez. Começa a chegar mais sangue em toda a região genital, causando um leve inchaço. A quantidade de secreção normalmente aumenta e fica mais espessa. Um dos objetivos dessas modificações é se preparar para o nascimento do bebê. Por isso haverá também um relativo amolecimento dos tecidos da região, facilitando sua expansão no momento do parto.


Vamos terminar comentando o apetite da grávida. Não, não é mito, ele muda!
Elas têm realmente vontade de comer coisas diferentes e que não comiam antes. Ou simplesmente não suportam mais algo que sempre adoraram. Há um aumento geral do apetite e da sede, com salivação abundante.
E onde está o mito? Na carinha do bebê... não, ele não vai parecer uma berinjela ou um estrogonofe se a grávida não comer imediatamente aquilo que deseja. Por outro lado, papais devidamente chantageados, por que não sair domingo às 10 da noite atrás daquela deliciosa alcachofra? Já faz parte do folclore.

Como encerramento de hoje, fica a dica de alimentação: a grávida se beneficiará de uma alimentação feita em pequenas quantidades diversas vezes ao dia (ao invés de comer bastante apenas 3 vezes, por exemplo), evitando assim picos muito grandes de hiperglicemia (muito açúcar no sangue) seguidos por períodos cada vez mais intensos de hipoglicemia (pouco açúcar no sangue).

Espero ter sido um bom início de blog. Comentários são sempre bem-vindos!


Fonte: Fortunato, S. M., A. L. Soares, S. ADAPTAÇÕES MORFO-FUNCIONAIS NA MULHER GRÁVIDA. Aula teórico-prática da Faculdade de Medicina da Universidade do Porto.
Aula ministrada pelo Dr. Belmiro Gonçalves Pereira na disciplina Semiologia e Propedêutica do curso de medicina da FCM - Unicamp - 2010.